'Minhas memórias', de Hélio Bicudo, realiza uma qualidade rara - funde a pessoa de tal forma com a história que se confunde com ela. Ler suas memórias é revisitar a história do Brasil sob muitos ângulos vividos pelo autor. Hélio Bicudo não é um, são muitos - promotor público, procurador da Justiça, jurista, jornalista, político, membro-fundador do PT, da Comissão Justiça e Paz de São Paulo, pensador das questões da justiça, escritor e, não em último lugar, cristão engajado ao lado do cardeal dom Paulo Evaristo Arns nas lutas pela vida e dignidade humanas. Um fio condutor une todas estas dimensões - a coerência, a honradez, a probidade e a força moral que engalanam toda sua atividade. Conheceu a bem-aventurança das perseguições e das ameaças de morte. Soube enfrentá-las com os instrumentos da justiça e com a coragem pessoal. O que ressalta é seu alto conceito de justiça, não como mera legalidade e ato burocrático da aplicação de leis a partir dos palácios da Justiça, mas como o sentido do direito vivido na inserção da comunidade e como busca permanente do bem comum junto ao povo e em sua vida concreta. Não deixou passar em branco nenhuma das grandes causas que clamavam por justiça como, entre outras, a investigação do Esquadrão da Morte ou o levantamento dos crimes de tortura, seqüestro e assassinato nos tempos sombrios da ditadura militar. Este livro de memórias dignifica a consciência ética, jurídica e espiritual dos promotores da justiça do Brasil.